Antiquado


Ninguém está aqui para limpar o pó sobre o meu corpo. Suas mãos, procurando meu coração, deixam marcas em minha pele. Dentro do meu peito você encontra o que queria. Mas não está mais tão brilhante como antes.
Tocando a ferrugem dos velhos sentimentos você se contorce.  Você ouve o ranger das engrenagens envelhecidas. Você não entende como fui deixado assim. Tanto tempo sem fluido e agora não existe mais salvação.
Assustada, você da passos para trás. A noite parece fazer todo o sentido agora.

“O que pode ser mais quieto que a noite?”

“Ele pode, ele pode!”

Ela sabe que isso é verdade, pois lá fora ainda existem andarilhos. Existe o vento o balançando a cortina da janela e, além de tudo, existem coisas novas. E aqui? Aqui existe uma velha cadeira. Um punhado de sonhos jogados em algum canto escuro da sala. Uma carta de amor em cima da mesa e um homem, vitima do desanimo, sentado com sua cabeça baixa. Não existe maneira de saber o que esta ali há mais tempo. O que é mais velho.
Paralisado, estático.
Uma peça de aço. Um refém do silencio com erros de fabricação.
O ambiente esta destroçando sua vontade de amar. Você encara a porta e corre, sem coragem de olhar para trás.
Para trás você deixa tudo que te parecia tão antiquado. 

Impossível (D)escrever


Nem o mais afortunado bardo do mundo conseguiria escrever depois de ter presenciado o que presenciei.
Seu cabelo esvoaçante como ouro no ar, refletindo a luz de todos os sois e ofuscando os olhos dos mortais. Perfumados como orquídeas nascidas em campos gloriosos em dias de outrora.
Seus olhos escuros como pedra tocada pelas águas oriundas do mar de seu nome. Suaves em sua maneira de olhar e, ainda assim, dispostos a arrancar minha alma para dentro de seu negrume. Preciosas pérolas.
Sua pele lembra-me a neve do lugar onde nasci e boas são as lembranças que tenho daquele lugar.
Seu canto oferecido aos deuses é carregado para o céu, onde você devia estar e não aqui, entre guerras e cruzados. Entre sangue e poeira. Entre homens tolos demais para compreender sua beleza. Tão incompreensível que fez minha discrição se tornar vaga.
Minha visão se tornou turva.
Pouco consegui escrever sobre você.Senhora que nunca irei conhecer.
E que possivelmente, voltara para os céus. 

Até Amanhã



O “até amanhã” é, em vários sentidos, melhor que o “até mais” e “até logo”.
Perto de frases tão vagas, ele consegue ter um significado concreto. Ao invés de horas sem dormir em claro, ele consegue acalmar os pensamentos.
Meramente um “até amanhã” é a certeza de que vai haver um amanhã. O peso deixou você descansar.
Nunca se sentiu tanta esperança em uma expressão dita pela boca dos homens.  As coisas ditas agora tem tudo haver com o que pensamos. As folhas de jornal estão sendo impressas porque agora, sem duvida, haverá um amanhã.
É provável que até amanhã duas pessoas se encontrem novamente. Ele olhe para seu rosto e elogie seu novo penteado. Ela se sinta envergonhada e agradeça pelo elogio. Eles rolem na grama ao fim da tarde. Até amanhã é possível, pois vai haver amanhã.
Até amanhã poderemos nos reencontrar. Sentados em um banco na praça olhando as janelas dos prédios. Tomando um café no melhor que lugar da cidade, que a propósito, ontem não conhecíamos. Observando as pessoas se darem conta que o ontem já se foi e estarem perdidas sem alguém para certificá-las que o amanhã existe.
Mas com você certamente haverá um amanhã.
Até amanhã.